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terça-feira, 3 de junho de 2008

Molecular: ABC dos Métodos Básicos - Parte 2

29 de Janeiro, 2008 por Vitor Hugo

Neste texto vou abordar as principais inovações que já viraram carne de vaca lá fora, mas “por aqui” (leia-se: eu acho legal pacas) continuam fazendo sucesso. E particularmente, algumas delas estou doido para tentar, como você bem deve saber no Brasil é complicado encontrar os pózinhos mágicos.

Este post faz parte de uma pequena introdução sobre o tema, caso queria leia a parte 1 (Molecular: ABC de Quem Não Sabe Nada - Parte 1).

Prepare-se, pois o texto é extenso…

Okay, meio mundo já copia esses métodos, mas são tão divertidos e interessantes! Então, vamos por partes: espumas, esferificação e geleificação.

Espumas, espumas e mais espumas

Molecular: espumas A literatura indica como inventor da técnica o chef catalão Ferran Adrià (el Bulli), classificado como “Foam Culinary“. Mas antes de entrar na explicação dos dois tipos básicos temos que fazer uma pequena contextualização de que espuma é simplesmente uma substância formada quando você aprisiona bolhas de ar (ou qualquer outro gás) num líquido ou sólido.

O modo mais conhecido criado por Ferran é o que usa o sifão (garrafa de chantilly) com cartuchos de óxido nitroso (um tipo de gás). É feito um suco (de frutas, vegetais ou algum líquido com sabor) misturado com ágar/gelatina (ou creme de leite) colocado tudo dentro do sifão injeta-se o gás e está pronto. Só deve ter o cuidado para que não tenha nenhuma partícula no líquido usado que possa entupir os mecanismos do sifão.

Com esta mesma técnica é possível fazer merengue instantâneo ou espuma de sorvete, o procedimento é o mesmo. No caso do merengue dissolva o açúcar nas claras e coloca-se tudo no sifão. Com sorvete (o exemplo que visto foi com sorvete de baunilha) tem que esperar derreter, peneirar para retirar qualquer partícula.

A outra maneira temos que usar um produto chamado de lecitina de soja que não chega a ser alguma novidade, pois é usada como aditivo alimentar faz tempo. Tem o papel de emulsionar, ou seja, é emulsificante. Traduzindo: torna possível a mistura de dois líquidos que normalmente não se misturariam, como a água e o óleo. Encontrado em sorvetes, chocolates, margarinas e assim por diante.

Até pouco tempo atrás não conhecia essa técnica, meu primeiro contato foi com uma receita do chef Lionel Lévy (do Une Table, au Sud), Milkshake de bouillabaisse. Está certo que tenho um certo estranhamento com o prato, não, não o provei… mas só de pensar em peixe transformado em milkshake… ouch! Bouillabaisse é um tradicional prato provençal (sopa) feito à base de peixes e mariscos.

No preparado em questão tem como guarnição(?) espuma de laranja com a sopa e o chef usou lecitina de soja. No mesmo período de tempo que conheci a receita, vi (num vídeo, mas não está mais disponível) que Ferran fez a mesma coisa com um suco de cenoura.

Basicamente é só misturar os líquidos desejados e bater com um mixer. Ficou confuso? Então, assista esta demonstração de espuma de suco de beterraba. O resultado lembra a espuma feita com sabão, não?

Esferificação: que tal caviar de cenoura, beterraba, maracujá?

Molecular: Esferificação A explicação vai parece um tanto besta-simplista, mas é isso mesmo: aprisionar um líquido qualquer numa esfera perfeita, porém, como isso é feito que está toda a graça.

A esferificação tem como base o alginato (ou ácido algínico) que pode reagir com cloreto de cálcio (para o método clássico) ou com uma mistura de gluconato de cálcio e lactato de cálcio (para a inversa), todos são um tipo de sal. O importante nesse momento é saber do cálcio.

Alginato é uma substância extraída de algas marrons, possui caráter geleificante, utilizado na indústria alimentícia como aditivo alimentar para alterar a viscosidades de produtos (sorvetes e bebidas). Devido a suas propriedades químicas, o alginato reage com o cálcio (ou com outros elementos parecidos com o cálcio) o que resulta na formação da película que reveste as esferas resultantes da esferificação.

Basicamente existem duas maneiras de se realizar a esferificação.
No método clássico: alginato é dissolvido no líquido em que se pretende fazer as esferas, enquanto, o cloreto de cálcio é dissolvido em água. Assim, deve-se gotejar a mistura de alginato na água com cloreto de cálcio. Segundo algumas pessoas, desta maneira pode agregar sabor ao preparado. Proporção: 0,8% de alginato e 0,5% de cloreto de cálcio.

Na inversa: dissolve-se gluconato de cálcio e lactato de cálcio no líquido que irá virar as esferas, logo, o alginato deve ser dissolvido em água. Então, goteja-se a mistura do líquido na água com alginato. Com esta forma não existe a adição de outros sabores com resultado final, além de ser possível esferificar líquidos com alto teor alcoólico. Ainda pode ser necessário o uso de outros ingredientes como goma xantana (um tipo de espessante) e ácido cítrico (normalmente usado como estabilizante). Proporção: 0,5% de alginato e 2,4% da mistura de gluconato de cálcio e lactato de cálcio.

As proporções são médias obtidas de acordo com as receitas encontradas no site Texturas el Bulli.

Com este método que são feitos os caviares falsos dos mais variados sabores, como de cenoura, beterraba, pepino e assim vai. Entretanto, é possível fazer com os geleificantes, porém o resultado é levemente diferente.

Geleificantes: gelatina, ágar e metilcelulose

Tem a propriedade de geleificar! Ou seja, confere ao líquido a textura de gel modificando a sua viscosidade. Os mais conhecidos são os citados abaixo.

Gelatina: sendo o mais conhecido, de origem animal (obtido de ossos de bovinos), composto basicamente de colágeno (ou seja, proteína). Para se dissolver melhor necessita de calor, porém temperatuas mais baixas potencializa a ação geleificante. O uso é o básico que estamos acostumados, além de ser usada para as espumas

Molecular: Agar Ágar: mais difundido na cultura oriental, de origem vegetal sendo extraído de algas vermelhas. É um carboidrato (a grosso modo um açúcar) da classe dos polissacarídeos, ou seja, não é a mesma coisa que “gelatina”, possuem capacidades parecidas (propriedades geleificantes), mas do ponto de vista químcio são diferentes. Também necessita de calor para uma melhor dissolução, entretanto, em temperatura ambiente já demonstra uma boa ação geleificante. Ou seja, caso fique fora da geladeira não derrete.

Foi com ágar que pude fazer o “caviar de maracujá” que fica semi-sólido, ou seja, quando se corta a esfera não sai nenhum líquido de dentro. É com este produto que também é feito o spaghetti de parmesão (ou de qualquer outro tipo de líquido).

Metilcelulose: é um derivado da celulose (que por incrível que parece também é um tipo de polissacarídeo, ou seja, um carboidrato), assim como os demais também altera a viscosidade e pode ser utilizado como emulsificante também. A parte mais interessante é que as suas propriedade geleificantes são ativadas pelo calor, ou seja, tem que dissolver em água fria e depois esquentar. Devido a essa característica que o chef Ferran Adrià faz a “gelatina” quente dele.

Carboximetilcelulose: vulgo C.M.C
Havia me esquecido completamente desde outro geleificante! Aline (comensal habitué) soltou a pergunta, então vamos a mais esse ingrediente. Até o momento não vi nenhuma técnica que utilize o CMC na cozinha molecular, mas nunca se sabe. Mas na cozinha “normal” é usado na pasta americana em si e como cola para a própria pasta na hora de aplicá-la.

O CMC também é um derivado da celulose, não é a mesma coisa que o metilcelulose quimicamente falando, enquanto o metilcelulose tem que ser dissolvido em água fria, o CMC a temperatura não faz tanta diferença. Colocou na água já altera a viscosidade do líquido. Tem propriedade geleificantes e pode ser usado como estabilizante para emulsões (ou seja, impede que a emulsão se “quebre”. Emulsão é a mistura de dois líquidos que normalmente não se misturam, certo?).

Final

Estas são os métodos mais comuns e difundidos que são usados no mundo todo, ao menos, nos resturantes mais modernos e/ou conceituais. Algum dúvida ou sugestão é só comentar.

Referências

- Livro: Chefs - Segredos e Receitas
- Foam (culinary)
- Methylcellulose
- Texturas el Bulli
- JoCooking

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